"Educados para o medo", Professor analisa a criminalização dos estudantes da USP
Por Roberto Boaventura da Silva Sá*
Como previ em outubro/2012, a Mangueira quase foi para o segundo grupo. Seu samba era mequetrefe. Seu enredo “desomenageou” Cuiabá.Agora, findados os gritos e as “gastanças” do carnaval, quero pensar sobre os desdobramentos da denúncia que o Ministério Público de São Paulo (MPE) apresentou contra 72 estudantes da USP.
Em 27/10/2011, policiais militares, em patrulha, não souberam distinguir um crime de um pequeno delito. Por isso, prenderam três estudantes que usavam maconha dentro do campus.
Em 27/10/2011, policiais militares, em patrulha, não souberam distinguir um crime de um pequeno delito. Por isso, prenderam três estudantes que usavam maconha dentro do campus.
Por conta disso – e sabedores das ações da ditadura militar –, um grupo de estudantes ocupou a reitoria daquela instituição.
De sua parte, a administração da A USP, para garantir a reintegração de posse, solicitou o aparato bélico do Estado. Em 08/11/2012, mais de 400 policiais tropa de choque, da polícia montada, do GOE, do GATE, além helicópteros, cercaram o prédio e prenderam as pessoas que ali estavam.
Imediatamente a esse violento desfecho, até então inusitado no “Brasil democrático” do sec. XXI, uma Assembleia Geral dos Estudantes foi realizada. Cerca de 4 mil acadêmicos votaram a favor de uma greve, que se estendeu até o início de 2012.
As reivindicações centrais foram: fim do convênio da USP com a PM/SP; criação de um grupo para discutir outras formas de segurança interna; renúncia do reitor João Grandino Rodas; não-punição administrativa dos estudantes.
Nesse sentido, conforme publicou o jornal O Estadão de São Paulo (07/02), “parte dos 55 estudantes denunciados pelo MPE por formação de quadrilha e mais quatro crimes na ocupação da reitoria USP, em novembro de 2011, foi absolvida, na semana passada,
instituição. De acordo com a defesa dos acusados, a decisão da comissão de professores foi tomada antes da apresentação da denúncia à Justiça, na terça-feira (05/02).
Além deles, mais 17 pessoas – incluindo funcionários – foram acusados não só por formação de quadrilha como por posse de explosivos, dano ao patrimônio, desobediência e crime ambiental por pichação. A denúncia foi para o Fórum Criminal da Barra Funda, onde será analisada por promotor e juiz”.
Como eu disse no início, essa denúncia – mais uma tentativa de criminalizar e silenciar os movimentos sociais – veio entremeada por gritos e berros de foliões embevecidos. No entanto, por mais esticados que sejam, os carnavais acabam. A “vida normal” segue seu curso, sem máscaras...
E – resguardando as devidas diferenças – “a vida normal” de hoje segue, em termos didáticos, de forma semelhante ao que o “status quo” do século XVIII proporcionou ao país, ainda no regime colonial.
Naquele momento, punições e castigos públicos impostos a um grupo formado por uma maioria de intelectuais – adeptos dos pensadores iluministas e, por isso, questionadores também dos altos impostos cobrados pela Coroa Portuguesa – serviram como as primeiras e grandes lições de como deveríamos ser medrosos para sempre. Na figura de Tiradentes, morto e esquartejado, a lição do medo chegou ao ápice.
Hoje, essa denúncia do MPE contra esse coletivo da USP serve como exemplo geral; ou seja, se aqueles estudantes forem punidos judicialmente, o Movimento Estudantil poderá perder ainda mais a capacidade de indignação e organização política. Poderá ser a morte simbólica da luta dos jovens acadêmicos.
Com essa denúncia, reforça-se o cultivo do medo, elemento arraigado em nossa cultura, e tão bem observado por Drummond, no poema “O medo”: “Em verdade temos medo.../ Nascemos no escuro.../ E fomos educados para o medo...”
*Roberto Boaventura da Silva Sá é Dr. Jornalismo/USP e Prof. Literatura/UFMT
Comentários
Postar um comentário